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Llega la noche de este "día internacional de la tolerancia" (¡menuda celebración!). Es el mismo día en que Polonia y Hungría vetaron los fondos para la reconstrucción europea post-Covid. Es la misma noche en la que leo lo escrito por el psiquiatra y profesor de la Universidade do Minho, Pedro Morgado, publicado hoy en el diario "Correio do Minho", un interesantísimo artículo que es todo un aviso a los navegantes, en los difíciles tiempos políticos en los que nos ha tocado vivir.
El artículo es una abierta condena a las posiciones políticas extremas; nos recuerda las grandes tragedias originadas en Alemania y Rusia... pero, sobre todo, es una advertencia muy clara sobre el protagonismo que están adquiriendo los movimientos extremistas, comenzando por la extrema derecha en diversos países europeos. Con la debida venia, reproducimos a continuación lo referido por el profesor Morgado.
Aprendemos alguma coisa com a História?
Na última semana, militantes da
extrema-direita polaca incendiaram
casas que tinham nas suas
varandas bandeiras dos partidos da oposição
democrática e dos movimentos que
defendem a igualdade entre todos os seres
humanos. Isto sucede num momento em
que o Tribunal Constitucional (escolhido
pelo governo de extrema-direita no poder)
proibiu a interrupção da gravidez nos
casos de malformação do feto. A ideia, dizem
eles, é materializar a visão de que
uma mulher não deve ambicionar mais do
que cuidar do marido e dos filhos.
Nos Estados Unidos da América, depois
de Joe Biden ter sido eleito com o maior
número de votos de sempre, o candidato
derrotado nas urnas recusa-se a aceitar o
resultado, convidando os seus apoiantes a
defenderem nas ruas o seu “direito” a permanecer
no cargo. Os jornalistas que
anunciaram a vitória de Biden têm sido
ameaçados por Trump e intimidados pelos
seus apoiantes. O alvo mais recente
são aqueles que trabalham na Fox, uma
cadeia de televisão que promoveu afincadamente
o populismo do Partido Republicano.
Nesta campanha surrealista, Steve
Bannon, conhecido ideólogo da campanha
de intoxicação mediática que elegeu
Trump, apelou mesmo à decapitação de
Anthony Fauci, o médico que lidera a
DGS americana e os esforços da ciência
para conter a pandemia.
Estes acontecimentos parecem inacreditáveis
mas são, infelizmente, verdade. Em
Portugal, o populismo da extrema-direita
xenófoba também está a crescer. O fenómeno
replica o que aconteceu em outros
países da Europa e da América. Nas redes
sociais multiplicam-se movimentos que
semeiam dúvidas acerca da realidade: os
“Médicos pela Verdade”, os “Jornalistas
pela Verdade” e as páginas de suposta luta
contra a corrupção dedicam-se a espalhar
mentiras, invenções, exageros e deturpações.
Pretendem convencer as
pessoas de que nos estão a esconder a verdade
e de que a realidade é uma invenção
dos poderosos e de algumas minorias.
No caso da covid-19, estes movimentos
manipulam o descontentamento dos mais
afetados pela crise pandémica, fazendoos
acreditar em graves mentiras. Todos
desejávamos que o vírus não existisse,
que as medidas de restrição de circulação
não fossem necessárias e que o turismo
continuasse a alimentar a nossa economia.
A realidade dura com que nos deparamos
é que o vírus existe, é muito perigoso
e se não travarmos a sua rápida
disseminação teremos que deixar morrer
as pessoas que necessitem de cuidados de
saúde, independentemente da sua idade.
Só se surpreende com o que está a acontecer
em Portugal quem não sabe como
evoluíram estes movimentos extremistas
na Hungria, na Polónia, na Grécia ou nos
Estados Unidos da América. Em todos os
países, a desinformação, a manipulação e
a mentira são utilizadas como armas de
destruição massiva da crença das pessoas
na democracia. Ao mesmo tempo, descredibilizam
os jornalistas e os meios tradicionais
de comunicação social para os
substituir pelas suas páginas de desinformação
e manipulação.
A ideia destes movimentos é convencernos
da fantasia de que de existe uma
maioria oprimida por um sistema dominado
pelas minorias. Esta teoria, tão válida
como a crença de que o coronavírus
não é minimamente perigoso, é defendida
nas redes sociais por uma falange de descontentes.
Todos estamos descontentes com alguma
coisa. Todos achamos que trabalhamos
muito e que merecíamos mais. Todos
sentimos que o sistema democrático tem
injustiças. A extrema-direita capitaliza todos
os descontentamentos numa amálgama
de ódios que colocam em causa a convivência
e a paz sociais. Aos privados
prometem esmagar os mandriões dos funcionários
públicos, aos enfermeiros prometem
melhores horários e maiores salários,
aos empresários prometem acabar
com os impostos que financiam o SNS,
aos trabalhadores pobres prometem acabar
com os corruptos que gerem as empresas
e aos corruptos da sua facção prometem
um sistema judicial que os proteja.
Conhecendo a História, há duas coisas
que me inquietam particularmente neste
momento.
Em primeiro, a forma como se repete a
ascenção dos movimentos radicais que
marcaram os anos 20 e 30 do século XX;
iludidos por líderes que lhes prometiam o
paraíso, todos os países governados pelos
extremismos xenófobos e populistas experimentaram
o inferno – a Alemanha e a
Itália condenaram-se à destruição total;
Portugal e Espanha condenaram-se à pobreza
e ao atraso estrutural de que ainda
padecemos; os países da antiga URSS, incluindo
a Rússia, condenaram-se à pobreza
e à escravidão que sabemos.
Em segundo, a passividade geral perante
a ameaça que estes movimentos representam
para a nossa democracia, para a nossa
paz, para a nossa convivência e para as
nossas vidas. Podemos argumentar que o
maquinista dos comboios para Auschwitz
também foi uma vítima do sistema nazi.
Mas a dura realidade é que grande parte
dos alemães preferiu ignorar as ameaças
dos nazis aos judeus, aos ciganos, aos negros,
aos homosssexuais e aos comunistas
porque acreditava aquele modelo de sociedade
poderia favorecê-los. Quando alguns
perceberam que tinham vendido a
alma ao diabo já era tarde demais.
É por conhecermos a História que não
compreendemos a decisão de trazer os
movimentos populistas e xenófobos para
o campo da governação democrática. Ao
fazê-lo, Rui Rio legitimou-os. E, pior que
tudo, incentivou os militantes e apoiantes
do seu partido a defenderem a legitimidade
da extrema-direita populista. É com
enorme tristeza que vejo militantes do
PSD e do CDS, alguns dos quais amigos e
conhecidos, levantarem a voz para defender
a legitimidade destes extremismos.
Sempre que os leio, recordo o que sucedeu
nos anos 20 e 30 do século passado
quando a manipulação do “inimigo comum”
levou tantos moderados a estenderem
a mão aos nazis e aos fascistas. E pergunto-
me como é que se sentirão quando
os extremistas – que eles seguramente
não são – vierem buscar alguns das suas
próprias famílias.
Todos sabemos que é mais difícil semear
a tolerância do que incentivar o
ódio; que é mais fácil lançar a dúvida sobre
o sistema democrático do que gerir as
suas imperfeições; que é mais difícil informar
com verdade do que espalhar a
mentira e a desinformação. Lidar com a
ameaça da extrema-direita populista não
é simples e o debate sobre a melhor forma
de o fazer domina a política europeia.
Penso que Rui Rio cometeu um erro. Desejo,
sinceramente, que o PSD não prove
o veneno que ajudou a cultivar. Um PSD
à margem do extremismo é fundamental
para o nosso sistema democrático.
PEDRO MORGADO es psiquiatra y profesor universitario |